Comentário sobre o texto de Jorge Larrosa Bondía, Notas sobre a experiência e o saber da experiência
1. Palavras
Larrosa começa o texto falando de palavras. Emprega binómios como teoria /pratica, experiencia/ sentido ou informação/opinião. Acho muito interessante a importância que ele dá ao peso da palavra. Até há pouco, eu estava totalmente contra a palavra: contra o teatro textual, contra expressar tudo com palavras, de que tudo estivesse submetido às palavras. Tive que aceitar que isto é assim, que o nosso pensamento funciona com palavras e que inclusive o que não se diz está feito de palavras. Relacionava o poético e a conexão entre as pessoas com algo mais além da palavra, mais não é isso, senão mais bem, é a forma de expressar essa palavra o que lhe dá um sentimento ou um peso e não outro.
As palavras dão sentido à nossa vida:
“E pensar não é somente “raciocinar” ou “calcular” ou “argumentar” (...) mas é sobretudo dar sentido ao que somos e ao que nos acontece” (pax. 21, linha 9).
É muito importante o tema do sentido da vida, porque é o que nos faz viver, o que nos empurra a acionar, a fazer. A vida não tem um sentido por si, por isso cada um deve achá-lo, e isso se faz a partir das palavras.
Lembrei-me com o uso dos binómios na teoria de Derrida, do facto de que funcionamos por contrários, pensamos opondo cousas e que todo esse opor é fictício, já que a linguagem é totalmente fictícia. Isto coloca-me numa situação de confusão: se é algo fabricado por nós, como é possível que seja tão imprescindível?
2. Experiência
a) Etimologia
“O que nos acontece (...) e o que nos passa (...) não o que se passa”
“SE DIRIA QUE TODO LO QUE NOS PASA ESTA ORGANIZADO PARA QUE NADA NOS PASE” Esta foi sem dúvida a frase que mais me fez refletir de todo o texto. É bastante frustrante, o mundo moderno está feito de tal forma que já não podemos gozar das coisas da mesma maneira, já não nos impregnam. É por isso, em parte, que decidi estudar arte. Para parar, para sentir, porque quando vamos ao teatro ou a um museu, de algum jeito abstrais-te do “mundo da rapidez” que há aí fora. Porque o teatro se trata do presente, do aqui e do agora, não do passado nem do futuro. Um lugar aberto a experiência.
Isto abre um debate dentro de mim, uma frustração de querer fazer algo e não ser capaz. -Quero respirar as coisas, quero que me transformem, mas sempre é difícil... a tal ponto que às vezes faço coisas que gosto por obrigação, porque deveria. E o mundo do sujeito produtivo é um combate difícil. Faço referência agora a citação que começa o texto, de Kafka “No combate entre você e o mundo, prefira o mundo". Se queremos ou não, temos que nos adaptar ao mundo de algum jeito, para sobreviver.
O mundo parece nos guiar, que há uma forca superior que nos dita, e a força da civilização moderna: o excesso de informação, de opinião, de trabalho e a falta de tempo. Os elementos dos que fala o autor.
b) Educação
Essa obsessão pela informação e pelo saber é imposta no individuo desde criança. Estes excessos conseguem que nada nos aconteça. Acho muito interessante a diferença que fez entre “informação”, conhecimento ou “aprendizagem” e “experiência”.
Todos esses excessos impedem a experiência, que como já disse é o que realmente nos da vida. Senão somos robôs, somos máquinas de memorizar, aprender e trabalhar.
Traduz o jornalismo como a “aliança perversa entre informação e opinião”.
Relaciona a falta de tempo com a escola e com a vida em geral, sempre temos coisas que fazer na sociedade atual e somos, dalgum jeito, pressionados estar continuamente excitados. Sempre queremos mais, mais e mais. É o século da velocidade. O tempo empregado como uma mercadoria me preocupa. Igualmente fala da conversão de experiência em créditos na universidade, confundindo trabalho com experiência. “Por não podermos parar, nada nos acontece”.
c) O sujeito da experiência.
Características:
- Passividade ativa
- Exposição, recetividade
- Paixão
Como não vai ser um artista um sujeito da experiência? Por suposto que é necessário, porque significa expormos, como diz o autor, “com todo o que isso tem de vulnerabilidade e de risco”. Que é o teatro se não risco? Que é uma improvisação senão abrir-se e receber? Uma passividade ativa. Estar, existir, estar presente. Que é um ator sem presença?
Introduz a Heidegger explicando que para ele é um sujeito derrubado pela experiência, a experiência apodera-se de si, não tem poder sobre a sua vontade. Algo assim como a ideia de inspiração que provem dos inícios do teatro, na cultura greco-latina. Um artista era aquele eleito pelos deuses, um facto não controlável por nós, senão pelo além. A experiência é, por tanto, algo além de viver um fato. Penso que é o que nos da humanidade, o que nos afasta de parecermos cada vez mais máquinas programadas, o que nos afasta da contemporaneidade fria e distante. Diz que um sujeito incapaz de experiência, seria um sujeito firme, forte, impávido (...) apático. Um artista não é isso, um artista é alguém empático e sensível. Um artista não é só um ser racional e calculador, é alguém que precisa mostrar a sua experiência, não o seu saber.
Relaciona-se também, como diz Bondia, com a paixão, com alheio e a alienação.
d) Qualidade existencial
“Ninguém pode aprender da experiência de outro”. É por isso que cada artista tem algo de pessoal, de interessante, por isso é interessante que o artista mostre a sua forma de ver o mundo, porque é a única pessoa que pode fazê-lo desse jeito, apesar de ser milhares de pessoas na face da Terra. Isso é o mais bonito da arte e do teatro, a individualidade compartida.
Diz que desde que o conhecimento não é um pathei mathos está desligado da vida; não é um saber que nos alimente. E é que a arte esta aí para alimentar as nossas almas, para fazermos sentir algo, não para informarmos... não tem que ser verdade, tem que ser real e tem que estar vivo.
“Se o experimento é repetível, a experiência é irrepetível (...) e uma abertura para o desconhecido”.
A arte tem esse algo de misterioso e irrepetível.